
O que a liberdade e a autonomia têm a ver (e podem ajudar) a Gestão de Projetos?
Um sistema de trabalho liberal, tem como principal objetivo a valorização da autonomia e proteção dos direitos dos indivíduos, garantindo-lhes a possibilidade de fazer o que desejarem desde que isso não viole o direito de outros. Já um sistema planificado de forma central tem como premissa um senso comum de direção decidido de forma unilateral por alguém, e este último é responsável por todas as principais decisões, centralizando seu poder de escolha de forma que seja garantido uma uniformidade maior para qualquer decisão que os indivíduos tomem, uma vez que o organismo central tende a saber melhor as necessidades do sistema do que as partes envolvidas.
Explorando estas duas visões opostas, é possível encontrar paralelos com os tipos de programas de Excelência Operacional (OE) nas empresas. Em sua maioria, os programas de OE de sucesso tendem a ter um forte patrocinador dentro da companhia. Geralmente este Sponsor banca o programa pois sabe os resultados que os projetos geram ou acredita, por casos externos, que darão. Claro, há exceções, mas em geral nenhuma empresa competitiva mantém funcionando algo que não traz resultado algum. Tendo como exemplo programas de OE com base na metodologia Lean Six Sigma, vemos que um dos principais fatores para o sucesso do programa são os chamados Tollgates, checkpoints onde os times apresentam seus projetos para a Alta Direção a fim de receber um feedback sobre o andamento destes e sugestões de próximos passos, além de ser uma excelente oportunidade para remover impedimentos que possam surgir durante o andamento da jornada.
O problema que está acontecendo é que em grande parte dos programas de OE, este apoio tão essencial e estratégico por parte da Alta Direção acaba centralizando as decisões e diminuindo a velocidade dos times, principalmente no momento em que é necessário aprovação de budget para execução de soluções propostas. Obviamente que um aval estratégico deve acontecer, mas a partir do momento em que um projeto estratégico começa a ficar emperrado por falta de um evento onde serão chanceladas as ações do projeto, os resultados e a reputação de um programa podem ficar em risco.
Claro que podemos debater aqui o fato de que, se realmente este programa é estratégico, as pessoas chaves participariam das reuniões. E longe de eu estar propondo um programa de OE sem Tollgates ou encontros com o nível gerencial da empresa. O ponto é: devemos deixar neste caso a utopia de lado, pois aqueles que estão envolvidos no dia a dia com o programa sabem que, não importa quão fã o patrocinador seja, emergências e necessidades de remarcar reuniões acontecem, gerando possíveis atrasos aos projetos.
Desta forma, um novo modelo de gestão foi nascendo, baseado em uma sistemática muito similar com a do Liberalismo citado no começo do texto. Falei em outros artigos que vocês podem ver aqui sobre a questão dos métodos ágeis e dos sistemas complexos. Apenas recapitulando, um sistema complexo é aquele onde a pouca previsibilidade de como os agentes respondem a mudança das variáveis envolvidas com um resultado. Esta imprevisibilidade gera mudanças. Um problema hoje para uma central de atendimento pode ser irrelevante amanhã, ao passo que algo nunca antes percebido possa surgir de surpresa. Neste cenário, o modelo de Management 3.0 desenvolvido por Jurgen Appelo tem um grande benefício, pois ele considera que as equipes de projeto devam ser organizadas de forma celular, e com autonomia para responder a mudanças de forma mais rápida e ágil. Se eu tiver que esperar todo o corpo diretivo da empresa tomar a decisão sobre cada pequeno assunto envolvido em cada projeto (o que configura um modelo de planificação centralizada), ao passo que essa informação descer de novo para as equipes envolvidas, elas podem ser desnecessárias e desatualizadas, pois o sistema complexo se reconfigurou e mudou sua forma de atuação. Jurgen Appelo acredita que as mudanças puxadas pelos projetos devem acontecer de forma orgânica, como um fractal, onde as pequenas mudanças e comportamentos gerados pelos times de projetos moldarão as mudanças e comportamentos maiores da empresa, e não o contrário.
Ressalto de novo que sei que é inviável pensar em um programa com projetos que tenha um respaldo para gerar transformação na empresa se este estiver distante do fórum de discussão da Alta Direção. Por isso, o que proponho é que tenhamos um modelo híbrido, ou novas formas de gestão de projetos que possam ajudar a quebrar estes paradigmas, e tornar os projetos mais rápidos e ágeis. Nós mesmos do Setec Consulting Group desenvolvemos já faz algum tempo o modelo do KAIZEN SPRINT® (Clique aqui para conhecer mais), onde conduzimos os projetos de LSS em formato de Sprints, focando uma variável de processo por vez, gerando melhoria incremental de forma mais rápida e dinâmica. Mas existem também outras alternativas: Será que todas as ações estruturantes têm que passar por aprovações superiores? Por que não criar critérios prévios de níveis de autoridade para implementar soluções, sem necessidade de subir o tema? Ter algum budget reservado para os times de antemão, com esse tendo que demonstrar depois os resultados alcançados com estes investimentos?
Sei que a questão é bem complexa e podemos ficar aqui discutindo outras formas e soluções de tentar passar por essas dificuldades, e este é o principal objetivo deste texto. O que temos que entender é que assim como sociedades centralizadoras em suas decisões tendem a ter um tempo de resposta naturalmente mais lento, programas deste tipo podem passar por esse caminho também. E em um sistema tão dinâmico e complexo como o atual que vivemos nos projetos, um pouco mais de liberalismo pode ser a solução.