
A Galinha dos Ovos de Ouro – Um conto sobre causas comuns e causas especiais.

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Imagine o Sr. Epaminondas, dono da pequena e próspera Avicultura Galinha dos Ovos de Ouro numa pequena cidade do interior do país. Seu galinheiro produz ovos orgânicos e artesanais com escala reduzida em função da complexidade da operação que abriu mão da automatização ou uso de rações fortificantes, em espaço aberto sem restrição das galinhas.
Para garantia da qualidade, o Sr. Epaminondas implantou uma inspeção visual antes da embalagem, na qual detecta ovos com coloração diferente, fora do tamanho, galados ou quebrados. Recentemente, ele vem encontrando o seguinte resultado:
Ou seja, até 50% dos seus ovos, em algumas embalagens, estão apresentando algum tipo de defeito, sendo classificados como impróprios para venda em seus principais clientes, sempre muito exigentes. Globalmente, aproximadamente 6% dos ovos eram descartados Dessa forma, o Sr. Epaminondas resolveu contratar um consultor, o Sr. Sófocles – especialista em controle de qualidade e controle estatístico do processo.
Eis que se desenrola a seguinte conversa:
-Sr. Sófocles, preciso de sua orientação sobre como resolver o problema dos ovos com defeito. Qual sua orientção?
-Para resolvermos o problema, precisamos descobrir inicialmente a sua causa.
-Ok, vamos olhar então o tipo de ração, a temperatura, as vacinas, a forma de acondicionamento dos ovos. Consigo fazer uma varredura de todo o processo para saber se todos as condições mínimas estão sendo atendidas. Porém, irá levar tempo.
-Não precisa Sr. Epaminondas. Vamos primeiro estudar o resultado com mais profundidade. Duas perguntas: Você possui o histórico do percentual de ovos defeituosos? Você possui rastreabilidade entre os ovos e as galinhas?
-Como assim?
Eis que o Sr. Sófocles, fez a seguinte explicação: “Antes de definirmos a abordagem para resolver o problema, precisamos saber se a origem é uma causa do tipo comum ou especial. Somente a partir disso, poderemos seguir para a avaliação da causa raiz e para o plano de ação”
-O que é uma causa comum ou uma causa especial?
Nesse momento, o Sr. Sófocles fez dois desenhos no quadro de avisos que estava disponível naquele espaço do galinheiro:
-Um fator extremamente importante dentro de qualquer processo é o fato de que suas características não se repetem com precisão. Mesmo na natureza nada se repete exatamente. Muitas variações são normais e inevitáveis, resultantes de muitas causas complexas. Por exemplo, um produto é formado por vários componentes, cada um contribuindo com uma parcela insignificante para a variação total, que consideramos natural e aceitável. Estas causas são muito difíceis de serem identificadas e as chamamos de Causas Comuns. Existem também variações não normais que provocam mudança repentina no comportamento natural do processo. Estas causas são mais fáceis de serem identificadas e são denominadas Causas Especiais.
-Então a causa comum é algo recorrente e a causa especial é algo pontual? – reforçou o Sr. Epaminondas, atendo à explicação.
-Exatamente! As causas comuns são menos perceptíveis, aleatórias e tendem a gerar um efeito sistêmico com taxas de falha estáveis. Já as causas especiais geram um efeito pontual e normalmente imprevisível, afetando a estabilidade.
-Então temos um problema Sr. Sófocles. Infelizmente eu não possuo um histórico da taxa de ovos defeituosos. Esse indicador foi implantado recentemente, há 5 dias, pois percebi que os ovos descartados não eram apontados e a quantidade não era controlada. Criei esse controle exatamente para verificar as minhas perdas. Sei, desses 5 dias, que o problema persiste, mas não sei avaliar o cenário de longo prazo.
-Entendo. Primeiramente, parabéns pela iniciativa de implantar esse controle. Felizmente, temos outra opção. Vamos olhar as cestas de cada galinha. Você mencionou que cada uma tem seu próprio local para botar os ovos, certo? Vamos avaliar a quantidade de ovos com defeito em cada caso. Assim poderemos avaliar a fonte da variação.
-Não entendi.
Assim, o consultor novamente tomou o quadro e fez os seguintes desenhos:
-Em ambos os casos, a quantidade de ovos defeituosos nos cestos é igual a 3. Contudo, a fonte do problema é completamente diferente. Se conseguirmos avaliar a fonte do problema, podemos definir se precisamos entender o motivo pelo qual cada galinha eventualmente coloca um ovo com defeito ou se é um problema somente com algumas galinhas, mais fácil de tratar.
-Genial Sr. Sófocles! Vou falar com a equipe e já fazemos essa avali6ação agora!
Depois de algumas poucas horas, o resultado foi surpreendente. Num total de 50 galinhas, foram avaliados 6 ovos de cada uma num total de 300 ovos. Foram encontrados 18 ovos com problemas, num valor muito próximo ao estimado de% de defeituosos – coerente com o depoimento inicial do Sr. Epaminondas. Contudo, esses 18 ovos estava concentrados em apenas 6 galinhas, 12% do total. Essa galinhas colocavam 50% de seus ovos com problemas. As restantes, no período analisado, não demonstraram nenhum problema com 100% dos ovos perfeitos.
Em suma, o problema não era que 50 galinhas eventualmente colocavam ovos com problema mas sim que algumas poucas galinhas tinham uma alta taxa de defeitos. Dessa forma, rapidamente o Sr. Epaminondas anunciou:
-Sr. Sófocles, nosso condição é muito próxima do segundo cenário que desenhou. Estamos falando de uma causa especial, correto?
-Os dados apontam nessa direção, contudo o ideal é medirmos por mais tempo e realizarmos a análise de estabilidade do indicador para respondermos a primeira pergunta – respondeu para o Sr. Epaminondas, ponderado.
-Não será necessário. Verifiquei que essas 6 galinhas foram compradas recentemente, não foram criadas por mim. Além disso, posso ver que não estão saudáveis, sua penas estão sem brilho e caindo. Vou trazer o veterinário para elas mas, caso não tenha solução, vou retirá-las do galinheiro.
-Faz sentido Sr. Epaminondas, contudo, vale continuar acompanhando o indicador e criando um histórico após essa ação, ok? Veja, com base nessa medição e identificação da fonte de variação, refinamos o escopo do problema, reduzindo a necessidade de análise para definir a causa raiz. Caso o problema fosse em todas as galinhas, teríamos que olhar o processo como um todo e toda possível fonte de variação.
O Sr. Sófocles agradeceu, fez mais algumas recomendações e partiu.
Ao final, o Sr. Epaminondas teve a certeza que implantar o controle do processo com indicadores de qualidade e principalmente avaliando a fonte de variação do problema permitiu otimizar e ganhar tempo na forma de avaliar a causa e a tomada de decisão. Do contrário, teria gasto muito mais tempo e dinheiro na investigação de todas as possíveis causas do problema.